20 novembro 2007

Deu no "Espaço Vital"...

E, pra quem não sabe, agora a forçada de barra da juizada pra fechar acordo é geral na Justiça do Trabalho...

Fonte: http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?idnoticia=9582

Eu tenho a força!
Por Ingrid Birnfeld,
advogada


Em audiência na Justiça do Trabalho, a empregada doméstica alegava ter gozado férias em apenas quatro oportunidades, ao longo de um vínculo de mais de dez anos.

A empregadora, por sua vez, desacompanhada de advogado, afirmava que as férias haviam sido desfrutadas integralmente, muito embora não possuísse todos os comprovantes de concessão e pagamento das mesmas. Protestava pela produção de prova testemunhal, com a intenção de demonstrar que a reclamante as tinha usufruído, recebendo também o pagamento correspondente.

O juiz indeferiu o requerimento, ao fundamento de que a ausência de documentação acerca das férias gerava a presunção de que não tinham sido concedidas. Por essa razão, propôs acordo em valor que contemplava grande parte das férias postuladas.

- Não tenho como pagar esse valor – a reclamada rejeitou a proposta.

- Para mim, o que interessa é que a senhora não possui os recibos, e a prova das férias é documental – o magistrado insistiu.

- Não tenho como pagar. Se tivesse, até pagaria, em reconhecimento aos anos que ela trabalhou para mim.

- Minha senhora, eu vou lhe dizer de novo. Se as férias foram concedidas e gozadas, a senhora tinha de ter os recibos.

- Ela sabe que sempre teve férias – a patroa respondeu, olhando para a empregada, na expectativa de obter uma confissão.

- A senhora paga oito parcelas mensais de R$ 500,00 e estamos conversados. Ou espera a minha decisão.

- Não tenho como pagar. Só consigo pagar R$ 200,00 por mês.

- Mas se a senhora pagava R$ 500,00 de salário, pode pagar o mesmo valor para fins de acordo. Oito vezes de R$ 500,00, ou a sentença, e depois os seus bens penhorados – ameaçou, voz grave, deixando estupefatos os advogados que aguardavam as próximas audiências.

- Eu não tenho como pagar – repetia.

- A senhora quer que eu acredite? Sempre pagou e agora não pode mais, é?

- Sim, não posso mais – respondeu, embargada.

- Não pode mais?

- Não. Eu podia porque estava casada, meu marido ajudava – explicou, toda constrangida, antes de começar a chorar.

- Ora, por favor! Não estamos de brincadeira! Vou lhe condenar e a senhora vai ter de pagar, e sozinha – o juiz asseverou, já irascível.

A mulher caía em prantos. Os presentes entreolhavam-se, parecendo não acreditarem no que acontecia.

- Por favor! Eu não posso! – implorava com dificuldade.

- Onde a senhora pensa que está, hein? Num consultório sentimental? Eu, aqui, sou o Poder. Se o seu marido lhe deixou, a Justiça nada tem a ver com isso – bradava, peito inflado.

- Sua Excelência, isso aqui, como o senhor bem disse, é o Poder Judiciário, e não o território do He-man - um dos advogados que a tudo assistia irrompeu, inconformado, se aproximando da mesa e se colocando ao lado da empregadora.

E logo prosseguiu:

- Ou o senhor adia a audiência para que a reclamada possa estar acompanhada por advogado, ou nomeia um defensor dativo.

- O que foi que o senhor disse? - o magistrado perguntou, com intenção de intimidar.

- O senhor escutou e entendeu. O Poder é Judiciário, e o Estado é Democrático de Direito. Ou faz o que deve, ou outros personagens vão entrar nessa animação – devolveu, olhos fixos e expressão destemida, fazendo com que, após breve discussão, a audiência fosse adiada.

E nós, que presenciamos essa história quase de ficção, perguntamos: ser humano não mais é requisito indispensável para aqueles que querem julgar os homens?