08 novembro 2008

Satiagraha-me se puderes...




BRASÍLIA - Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmaram, ontem, as liminares que garantiram ao banqueiro Daniel Dantas, do Grupo Opportunity, o direito a responder em liberdade pelas acusações de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e suborno. Eles fizeram duras críticas à Polícia Federal e advertiram que as investigações devem ser feitas cumprindo as garantias de ampla defesa dos suspeitos de corrupção.

O julgamento transformou-se numa sessão de afirmação do papel do STF de rever decisões de instâncias inferiores e num desagravo ao presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, que, em julho passado, concedeu duas liminares para que o banqueiro pudesse responder em liberdade às acusações. A primeira liminar foi dada em 9 de julho, um dia depois de Dantas ser preso durante a Operação Satiagraha da Polícia Federal. Em 10 de julho, o juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Criminal de São Paulo, ordenou novamente a prisão de Dantas numa afronta à liminar de Mendes. Em resposta, o presidente do STF concedeu outra liminar, em 11 de julho, permitindo que o banqueiro respondesse em liberdade. Na época, procuradores da República e delegados da PF acusaram Mendes de " pular " instâncias do Judiciário e trazer para si um processo que tramitava na base da Justiça. Ontem, os ministros do STF foram unânimes ao rechaçar essa acusação.

O processo de Dantas chegou ao STF em junho, antes do início da operação, pois o banqueiro soube pelos jornais que estava sob investigação da PF e ingressou com um pedido preventivo de habeas corpus. Antes de chegar ao STF, o pedido de habeas corpus de Dantas subiu todas as instâncias do Judiciário, passando pelo Tribunal Regional Federal de São Paulo e pelo Superior Tribunal de Justiça, mas De Sanctis não permitiu que nenhum outro juiz tivesse contato com o teor das investigações, nem os ministros do STF.

O ministro Celso de Mello considerou " insolente " essa atitude de De Sanctis e criticou o fato de o juiz ter decretado " regime de sigilo do processo ao STF " . " É um comportamento inaceitável e há de ser censurado " , enfatizou Mello. " Quando um ministro do STF requisita informações ele não está pedindo. Ele está ordenando. "

O ministro Cezar Peluso criticou não apenas a conduta de De Sanctis, mas também de outros juízes que criticaram as liminares do presidente do STF. " Os juízes não são corregedores do STF " , disse Peluso.

O relator do processo, ministro Eros Grau, lamentou que juízes atuem em regime de parceria com delegados da PF e procuradores da República. " Juízes que arrogam a si a responsabilidade por operações policiais transformam a Constituição em um punhado de palavras bonitas rabiscadas em um pedaço de papel sem utilidade prática. " Para Grau, houve tentativa de intimidar o STF no episódio, com a divulgação através da imprensa de supostos encontros de integrantes do tribunal com advogados de Dantas que até hoje não foram confirmados. " Querem nos intimidar e não conhecem a história " .

Grau também criticou a prática da PF de chegar na casa de pessoas, determinar a prisão e apreender bens sem que elas saibam do que estão sendo acusadas. " De que vale declarar a Constituição que a casa é asilo inviolável do indivíduo, se moradias são invadidas por policiais munidos de mandados que consubstanciem verdadeiras cartas brancas? "

No fim da sessão, Mendes condenou duas práticas que, segundo ele, se tornaram comuns em processos envolvendo a PF: grampear o relator do processo e amedrontá-lo. " Houve o propósito inequívoco de desmoralizar essa Corte " , criticou.